quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

ABRAÇOS GRÁTIS! OUTRO VIÉS DA FEIRA

POR FÁBIO ALLEX

(Publicada no Jornal Pequeno em 10/12/2011)


Qual seria sua reação se, de repente, em algum local público, de muita movimentação, você fosse abordado por adolescentes de rostos pintados, saltitantes, exalando alegria, exilando males, exaltando a paz e o companheirismo, querendo lhe envolver com abraços?






Quem esteve na 5ª Feira do Livro de São Luís, mais precisamente no segundo dia de dezembro, além de contemplar e participar da vasta programação do evento, pôde também se surpreender e receber uma atração extra que trilhava na praça projetada pelo centenário Oscar Niemeyer: a turma do ‘Abraços Grátis’. A galerinha, além de apregoar a união, carrega no discurso (e nos abraços, claro), o desejo de oferecer, sem nada em troca, manifestações de carinho, como palavras de incentivo, a quem quiser, independentemente de classe social, padrões estéticos, raça, credo, sexo, idade.




Se para as bandas de cá, o mutirão de abraços é uma novidade, para as bandas de lá, em vários outros países, já está consolidado. De acordo com o site http://www.abracosgratis.com.br/, o ato ficou popular em 2004, na cidade de Sydney, por meio de um australiano conhecido como Juan Mann. Os abraços gratuitos passaram a ser ainda mais disseminados mundo afora, em 2006, após a disponibilização de um videoclipe, que já ultrapassa a marca de 71 milhões de acesso no Youtube, com imagens de Mann ofertando abraços pela cidade mais populosa da Austrália. O audiovisual contém a música ‘All The Same’, do grupo Sick Puppies, também do País dos Cangurus.

Seguindo a tônica do químico francês Antoine Lavoisier, de que ‘nada se cria, nada se perde, tudo se transforma’, a iniciativa foi copiada e trazida para São Luís pelos estudantes Thomaz Tobias, de 17 anos; Vitória Vieira e Yasmin Castro, ambas de 16 anos. A intenção singela e de etérea nobreza é propagar felicidade para desconhecidos e, assim, do mesmo modo, agregar em suas próprias vidas, esse estado de espírito que favorece a forma de lidar com o dia a dia. “Eu e minhas amigas [Vitória e Yasmin] estávamos passando por alguns problemas, estávamos tristes e resolvemos criar uma forma de ficarmos felizes. O abraço é o gesto mais bonito pra transmitir carinho e mostrar pra alguém que ele não está sozinho”, disse Thomaz.


E se agradar a gregos e troianos sempre foi uma tarefa árdua e indigesta em qualquer lugar (só para não dizer: impossível), não seria na Atenas Brasileira que isso iria acontecer. “É a terceira vez [na 5ª Felis] que a gente faz em São Luís. Fizemos duas vezes em um shopping. Tentamos fazer em outro, mas fomos expulsos. Algumas pessoas foram arrogantes, dizendo que têm mais o que fazer. Um disse não querer por que a cartolina [o cartaz usado com a frase abraços grátis] estava de cabeça pra baixo. E teve um cara que disse estar de dieta. O que isso tem a ver?”, relatou com ar de espanto.

Mesmo com raras e inevitáveis intempéries, a missão dos distribuidores de abraços tem sido cumprida. “Na primeira vez que a gente fez, a gente cantou aniversário pra uma senhora. Teve um cara que chorou ao me abraçar, dizendo que estava triste e era tudo que ele precisava naquele dia. Teve gente que [ao presenciar a ação] quis participar”, garantiu.


Sobre supostas segundas intenções passíveis de surgir em um momento inicial, o jovem faz questão de frisar que se trata de uma atitude sincera, e é apenas para contribuir com o bem-estar das pessoas que os cercam, sem pedir nada em troca, porém com a expectativa de ser agraciado com um sorriso. E se, porventura, alguém for visitado pela solidão, ela não deve ser hospedada, muito menos fixar residência. Todavia, se algo fugir do controle, um ‘basta’ precisa ser determinado. “Isso não é por dinheiro, não é de igreja, não somos de loja, não é pra divulgar nada, nem mesmo batom ou perfume”.



Para a trupe, a sociedade está muito individualista e ninguém pensa no próximo, a não ser em si mesmo. E a fim de remediar o desagrado, a fé e a poesia servem de inspiração. “Ainda que não estejamos representando alguma igreja, pensamos na parte da Bíblia que diz: ‘ame o próximo como a si mesmo’. [Segundo Mateus 19:19, a passagem bíblica discorre como: ‘Honra a teu pai e a tua mãe e amarás o teu próximo como a ti mesmo]. A gente se baseou também em uma frase do Cazuza, ‘abraço é o encontro entre dois corações’. E o abraço é pra mostrar: ei, você não está só, você tem amigo, somos irmãos e nós vamos passar carinho pra você, quando você precisar”.

Para quem quiser manter contato e agendar alguns abraços, foi criado um grupo no Facebook intitulado, previsivelmente, de ‘Abraços Grátis’. Entretanto, quem preferir deparar-se, inopinadamente, com os ‘abraçadores’ ludovicenses, o líder da iniciativa deixa um recado sobre a distribuição de afagos: “Agora que a gente está de férias, vamos fazer muito mais”. Entre braços que se misturam, pulsações que se convergem e carinhos que se entrelaçam, surgem os abraços, simples gestos capazes de humanizar a frieza dos mortais. Sendo grátis, melhor.





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