terça-feira, 1 de maio de 2007

AUTOSSUGESTÃO

(FÁBIO ALLEX)

Depois de cada estação, recolho autossugestão. Querendo, divido com você.
Mas, pode arder. A minha direção é curta e encena ação, e nem quer saber,
Apenas percorrer.

O incêndio incide nas mãos, resplandece, chama a atenção.
O alvitre é refém de um além sob vozes.

Durante toda a extensão, nada sobre a dimensão, nada consegui entender.
Mas, ainda quero aprender. Em cada esquina: vira-teimão.
Vem sempre antes do florão. Na busca do prazer, tudo faz valer.

Olhos nos olhos, meu bem. Feche os olhos também.
Eu não sei quantos anos você tem, mas há alguém antes de nós.
(Não me importa quantos anos você tem, mas há alguém sobre todos nós.)

(28-03-2004)

EM BUSCA DO VIR

(FÁBIO ALLEX)

Uma frase mal-dormida, um olhar em movimento.
Uma canção quase esquecida, um disparo, um tormento.
Pulsação, uma fadiga, um estranho acontecimento.
Uma passagem não percebida, um insolente pensamento.
Transverberar outro incêndio, outra luz, sentimento.

Não sei o que há atrás do indefinido. Eu sei o que é ser um fraco fortalecido.

Neologio sensações, anacoluto o comportamento.
O futuro não espera, sinto muito, eu lamento.
Um par inconcebido deve acabar em casamento.
Cabeça desocupada, infortúnio, mau temperamento.
O satélite, fogo-estrela, se faltar, complemento.

Nuvens disciplinadas e um caos tranqüilo. Finjo-me de morto p’ra não morrer.
Não dou chance p’ro vacilo.

(17-07-2000)

MEIAS-VERDADES

(FÁBIO ALLEX)

Não prometo o que não posso cumprir.
Incenso e bom senso, ofereço p’ra ti.
Minhas palavras não morrem mais.
Florescem e perfumam nos quintais.
É só abrir a janela, a paisagem é bela. Algo novo brotou.

Não cometo erros que já cometi. Cores e louvores, peço p’ra ti.
Meias-verdades não servem mais. São paliativas em noites-carnavais.
Portinari pintou na tela; sobre o mar, um barco à vela,
Que mesmo sem rumo, flutuou.

(31-12-2003)

O BEIJO E O SOLUÇO

(FÁBIO ALLEX)

O seu jeito é o mais simples e qualquer uma poderia ter.
Além de simples é o mais lindo, mas só quem tem é você.
É, devo confessar. Por existir você, devo agradecer.

Pelas mulheres que não me amaram, pelas canções que não pude fazer,
Trocaria por um rumo mais certo. Entre o que existe e o não-ser, devo optar.
Saber o que fazer p’ra não se arrepender.

Há uma paz que não responde, há um grito no olhar.
Uma sombra que não some, o seu nome p’ra chamar.
Nos seus beijos, meus lábios querem mergulhar, p’ra que o meu soluço possa respirar.

(03-02-2004)

O GRITO E O INFINITO

(FÁBIO ALLEX)

Em noites de frio, te procurei suando vinho, mares e lugares que te encontrei.
Em açoites e espinhos, eu sangrei, me cortando as horas, a chegada e o que eu deixei.

Levo o agora, evito a despedida.
O todo é só um pouco, e esse implora.
Lá fora, meu corpo habita.

O meu corpo em minha cama. Ao meu lado, a solidão reclama da tua ausência que transcende o quarto.
Perdido no espaço... Mas posso voltar...
Vai pondo a mesa, que eu já levo o pão.

Não vou embora, ofereço-te a minha vida.
O amor é um louco que tudo devora.
Em mim, uma paz que jamais será cinzas.

Trago do abismo, a luz que acaricia, um vento amigo, flores e manhãs.
Nossos odores perfumando a hortelã.
Não cai no esquecimento, os dias são a memória. Toda honra, toda glória é poder te tocar.
Bem que tento esquecer, mas isso já é lembrar.

Do infinito vem um grito que não demora pela hora da minha boca encontrar-se com a tua.
No meu ouvido, outrora aflito, tudo faz sentido. Até ouço sorrisos.
Pois, eu sou o grito.
E tu, o Infinito.

(01-09-2006)

O MOMENTO

(FÁBIO ALLEX)

Quantos destinos musiquei! Quantos poemas, eu tracei!
Quantas palavras inventei!
Mas, só as tuas falaram o que ninguém falou.

Quantas flores, eu neguei! Quantas verdades, eu plantei!
Quantas bocas, eu beijei!
Mas, só a tua mostrou-me a cor do calor.

Em quantos sonhos naveguei! Em quantos mares acordei!
Quantos olhares avistei!
Mas, só os teus enxergaram que o meu coração enxergou.

(12-02-2004)

PÉ NA TÁBUA

(FÁBIO ALLEX)

As luzes se apagaram, escuro na cidade. Ofusca um refletor,
O único que não apagou. Um vento releva a brisa, uma ideia inconcisa.
Intransigência! Por que tanta insatisfação?
As luzes se apagaram, escuro na verdade. As estrelas lá no céu,
Brincam de se esconder. Um vento releva a brisa, uma ideia sob cinzas.
Um chute na consciência. Até já me acostumei.

Norte e sul, pé na tábua. P’ra onde vou, não tem chegada.
Sou o que sou: não sou nada... Pés descalços sobre brasas.

As luzes se apagaram, escuro antes da tarde. Uma frase feita a lápis,
Sob tinta derramada no papel. Um vento releva a brisa, uma ideia que atiça.
Do avião sem paraquedas: peso-chumbo em mundo nenhum.
As luzes se apagaram, escuro na honestidade. No deserto é certo,
Numa viagem, a miragem delirar. Um vento releva a brisa, uma ideia que enfeitiça.
A âncora sopra a vela. Embarcação sem convés, marujo ao mar.

Onde estou é a minha estrada... Passo a passo pela madrugada.
Não há saída depois da entrada. Parece fim da linha, mas é só outra parada.

(06-02-2000)

PRATICAMENTE TEOREMA

(FÁBIO ALLEX)

Tudo clareou a partir do brilho do teu olhar.
Coração em disparada, mão suada, saudade e vontade de abraçar.
Foi tão fácil perceber que tu és o frio p’ro meu calor,
A semente que brotou, um sol no anoitecer.

Tudo navegou, e no fundo, um mergulho sem saber nadar.
Canção-madrugada, outra parada, liberdade em dualidade a beijar.
Não há culpados, não há reféns. Necessidades vão mais além.
O que espera, ninguém esperou. Não é erro sentir amor.

(11-01-2004)

SEM-DITA

(FÁBIO ALLEX)

Sinta a solidão, mas deixe-a, abandone-a, porque dói, fere, seca e até arde.
Nem tudo que foi lido será dito, repetido.
Imprevistos acontecem e fogem como um covarde.
Preste atenção: a voz que não cala fica rouca, água e sabão lavam roupa,
Mas não limpam o que não for verdade. A água já não molha, sequer mata a sede,
O mato cresce e perde o verde. O que ficou, agora é saudade.
Tire os pés do chão, sinta o vento no seu rosto, respire fundo, sinta o gosto.
O que está fora será posto trazendo a liberdade.
Ache o tempo, fique quieto, perde-se o filho ao ganhar um neto.
Mesmo que longe estará perto e verá de novo a mocidade.
O pequeno verso terá versão. E de volta ao começo, no mesmo caminho do avesso.
A paz encontra-se ao lado da crueldade. Em paradoxo ao acaso, flutua o fundo, mergulha o raso. O sempiterno vem sem-termo e acompanha a eternidade.
Sinta a solidão.

(01-02-2001)

TODA VEZ

(FÁBIO ALLEX)

Toda vez que você me fala; toda vez a resposta se cala.
Mais uma vez fico sem saber. Mais uma vez pergunto p’ra você.

Toda vez que você me chama; toda vez o ambiente inflama.
Mais uma vez o fogo é só arder. Mais uma vez queimamos sem querer.

Toda vez que você se engana, o chão desaparece: cresceu a grama.
Outra vez explico sem entender. Outra vez você simula aprender.

Toda vez que entro na sua sala; o olhar se esvai, a voz entala.
Outra vez visito o seu prazer. Outra vez, nada p’ra dizer.

Toda vez que vou embora: lágrimas saem, o coração implora.
Dessa vez sei que deveria ficar. Outra vez, um dia vou voltar.

(20-01-2005)